quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Pé na estrada

Resistir o que a vida te dá
no inexato momento que se espera.
Separa de quem se ama e dá a vida.
Dolorida dor necessária, premeditada.

Buscando a felicidade em novos horizontes,
desconhecidos como a própria fé.
Desafiando limites do misterioso.

Ninguém entende e pode entender;
Cada um segue seu rumo cheio de espinhos
No ramo de flores da idade,
sem vaidade deve seguir.

E o pranto da cidade entupiu bueiros
cheios de mágoa e solidão.
Leva tudo, arrasta, tormenta e reclama,
Como se pudesse no coração,
Viver e não sentir o que se sonha.

domingo, 21 de agosto de 2011

Nada

Fora das estações, longe do caminho.
Além do horizonte, onde nunca fui;
me vi perdido feito um andarilho
que se dispõe a esquecer o que passou,
como um pássaro a abandonar o ninho.

Por dentro eu tinha o nada,
mas o nada me torturava
e você para mim era nada.
Nada era como eu imaginava.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

16 de Agosto de 2010 (8º dia)



  Já era de manhã e já tinha gente arrumando as malas. Após tantas emoções vividas durante o ano com os ensaios e com essa viagem, agora chegava o fim de um ciclo vitorioso. Houveram muitas brincadeiras, seriedades, risadas, choros, ânimos, desânimos, alegrias e tristezas que valeram muito a pena. 

   Ainda batia forte a emoção da conversa dos Tenores reunidos em uma parte da casa na noite anterior, foi o que fechou a viagem. Não estavam todos, pois alguns não estavam acordados. Falamos de várias coisas, choramos juntos, rimos e fizemos confissões, pedimos perdão por alguma falha, agradecemos alguém e ali reunidos celebramos a união do que a Dona Maria Augusta (fundadora do Coretfal e mãe da Fátima) chamou de "o melhor naipe da viagem" no último ensaio antes de voarmos.

  Bruno foi o primeiro a partir, pois iria fazer sua própria turnê pela Alemanha e pra outros países próximos dali até chegar a Itália. Outros iriam para o Aeroporto de Frankfurt conosco e de lá iriam juntos para outros lugares e outros voltariam a Maceió, que era o meu caso. Eu não me sentia seguro de ficar mais tempo por lá, sem saber como me desenrolar e não muito confiante no meu inglês básico, mas cada coisa no seu tempo, ali eu não estava preparado com meus 18 anos, de emburacar no mundo sozinho tendo que dar satisfações para os meus pais. Outra vez irei a Europa novamente e visitarei outros lugares belos com toda a certeza e ficarei vários dias.

  Eu dei as minhas últimas voltas pelo Wegscheide sozinho lembrando de tudo o que passamos e olhando ao meu redor onde eu estava, me veio lágrimas aos olhos e agradeci cada momento vivido. Quando eu estava voltando para casa naquele friozinho, um ônibus branco que nos levaria embora apareceu na entrada do Wegscheide e passou por mim calmamente, ele por si só carregava para mim uma imagem triste de despedida. Ahh despedida...

  Como diria uma música sábia : "...A hora do encontro é também despedida..." ♪♫. Tudo passou tão rápido e aproveitei como pude, cada momento. Dizia adeus ao Wegscheide, a Gelnhausen, Usenborn, Frankfurt e Alemanha. Um dia tenho vontade de rever estes lugares, o meu adeus não queria ser para sempre e se Deus quiser, não será, pois foram lugares que me marcaram. Conheci pessoas que talvez jamais veja novamente e outras que provavelmente um dia verei, a vida é mesmo assim, cada momento é único. O essencial é vivê-los. Eu não seria o mesmo quando chegasse em Maceió, interessante é se redescobrir e ser como um rio que sabe contornar obstáculos, nunca é o mesmo e ainda chega onde quer : na imensidão do mar.

  De resto, outras pessoas do coro partiram para visitar outros lugares e o que sobraria para eu contar nesta postagem seriam apenas coisas como "cheguei no aeroporto, despachei a mala, fui para a sala de embarque e viajei de volta com a Nayara ao meu lado nos voos de Frankurt - São Paulo e São Paulo - Maceió.", o que não seria interessante nem grande o bastante para merecer uma postagem no blog. Não tinha pretensão de contar exatamente tudo desta viagem, tenha certeza que rolou ainda muita coisa do ponto de vista de outras pessoas e até do meu mesmo, certas brincadeiras e momentos à parte que não contei. Penso que fui fiél aos acontecimentos mais importantes (cantar na Caverna medieval foi ótimo).

  Quero deixar aqui anotado o meu profundo agradecimento aos outros 7 tenores que cantaram e encantaram lado a lado comigo, enfrentaram os mesmos problemas que eu enfrentei, sofreram e foram recompensados, riram e choraram juntos e foram o mais unido naipe do Coretfal até o fim desta viagem, sem criar polêmica, vexames ou constrangimentos e ainda emocionaram como o melhor grupo sonoro do Coretfal : Bruno Sandes, Márcio Rafael, Jefferson "Deto" Nunes, Wagner Santos, Rodrigo Cardoso, Leo Pooc e Valdo Régis. Queiram ou não, lembrarei de vocês pelo resto da minha vida.

  Encerro aqui o meu Diário de Bordo da minha viagem à Alemanha com o Coretfal - o coral mais criativo, emocionante e batalhador que eu conheci até hoje, porque conseguiu disputar pau a pau com os Grandes da Europa, mesmo tendo uma educação musical precária tradicional brasileira, pessoas trabalhando e estudando mais do que cuidando da voz e ainda foi eleito o 2º lugar da categoria Folclore, representando sozinho todo o Continente Americano. Deus abençoe o povo brasileiro que não desiste nunca diante das dificuldades e é o povo mais musical, talentoso, cultural, alegre e carinhoso da face da terra.



Fim.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

15 de Agosto de 2010 (7º dia)



  Mais um dia me acordando pelo despertador biológico dos outros, tomei café da manhã com os outros. O corpo era bem leve, nenhuma preocupação, uma sensação de dever cumprido. Nada nos tiraria do sério naquele dia, absolutamente nada. Era o dia de "nos curtirmos".

  Fomos convidados a ir a um vilarejo chamado Usenborn, o lugar mais longe que tínhamos ido até ali. Havia um coro nos esperando para cantar, beber e comer conosco. Logo depois do café da manhã, um ônibus foi nos buscar no Wegscheide para ir a Usenborn. Dessa vez o ônibus era de viagem, era bem confortável. Ele passava calmamente por paisagens bem verdes ao longo das estradas bem conservadas, dava para ver todas as paisagens pelo caminho : extensos campos verdes, algumas criações de animais, algumas casas perdidas no meio do verde e depois uns bonecos de palha gigantescos para enfeitar os campos para quem passasse na estrada.

  No meio do caminho, vimos um local que parecia um "camelô de Maceió". Era um estacionamento cheio de barraquinhas que vendiam quase de tudo. A maioria das pessoas pediram uma parada no local para fazer compras. Eu desci junto com o pessoal, dava para notar que os vendedores não eram europeus, eles eram puxados para os lados árabes da vida. Eles são famosos por essas coisas de comércio. Eu terminei esquecendo o nome de onde eles vieram, eu tinha perguntado para um vendedor, mas esqueci depois. Só lembro que terminava com "quistão", mas tenho quase certeza que era Paquistão. Pense em um povo que gosta de enrolar no preço !

  O Coretfal voltou para o ônibus com o dobro do peso, muita gente comprou várias coisas. Era agora a hora de partir novamente. Após pegar a estrada, logo mais vimos um lugar afastado das outras cidades, um já vi logo, pensei "Usenborn" e era lá mesmo. Que lugar mais pequeno e arrumado era aquele !  tudo bem limpinho, sinalizado e aconchegante. Paramos em um local logo após a entrada do vilarejo. Haviam duas bandeiras penduradas na parede, uma da Alemanha e outra do Brasil, algumas mesas postas a céu aberto estavam ali presentes também, junto com um bar.

  Ao entrar no estabelecimento, notei que haviam já muitas pessoas sentadas em umas mesas e à direita havia uma escada (um pouco íngreme) que levava a outro ambiente no primeiro andar. Subimos aquelas escadas e sentamos, logo mais foram servidos café com alguns doces e outros aperitivos. Quando acabamos de comer, fomos orientados a vestir as nossas roupas da categoria Secular para cantar. Eu desci as escadas e fui a um banheiro que ficava do lado esquerdo (pra quem saiu de onde estávamos) do conjunto de construções que estávamos. Quando voltei, o coro local iria começar a cantar umas músicas. Era um coro só de homens, todos bem legais, receptivos e alegres.

  Chegando a nossa vez de cantar, uma brasileira que mora lá apareceu e foi nossa tradutora naquele instante para nos comunicarmos com todos que estavam ali, que por incrível que pareça, era o vilarejo todo. Fizemos nossa formação padrão. Começou a chover lá fora, bateu um friozinho pela porta de acesso ao local onde estávamos. Era tudo o que eu queria para ficar perfeito, começamos a cantar e todos amaram. 

  Havia uma coisa que eu jamais tinha experimentado no Coretfal até aquele momento, que era ver alguém chorando ao nos escutar cantando, então quando cantamos a música Te Quiero, eu vi uma velhinha chorando em uma mesa perto. Eu me emocionei na hora e me joguei como uma luz emanando energia. A velhinha chorou mais ainda, foi demais. Era algo que transpunha as barreiras do Eu e passava a ser um sentimento coletivo único. Cantamos outras mais e fomos ovacionados, as pessoas aplaudiram muito, apitaram e foi a minha cartada final para aquela viagem como o melhor Tenor que eu podia ser e minha última lembrança musical da Alemanha. Extremamente emocionante.

 No fim, o retorno para o Wegscheide foi mais uma vez brilhante. As belgas foram nos visitar no mais tardar da noite. O meu olfato não é bom, mas as pessoas ao meu redor diziam que elas não estavam com os melhores cheiros. Eu não liguei, ali era hora de confraternização, a galerinha do Coretfal fez algumas brincadeiras constrangedoras com as belgas (o que foi aprendido com os espanhóis), elas notaram o teor da coisa e depois não deixaram mais rolar essas brincadeiras. Há quem diga que houve um caso lésbico entre duas das belgas do lado de fora da casa, mas no fim dançamos com elas e nos despedimos. Era o tempo de despedidas, algumas seriam as últimas das nossas vidas e outras soariam como um simples "até logo", mas elas eram inevitáveis.

14 de Agosto de 2010 (6º dia)



  O dia amanhecia calmo, mais um café da manhã típico alemão. Eu já tinha desistido de tomar um suco/chá, nem sei o que era precisamente, mas que tinha um gosto horrível. Fora isso, o resto das comidas eram boas. Amava uma pasta de nós para passar no pão. Havia dois tipos de pães : o amarelo doce (como no Brasil) e o marrom salgado. Não era só no café da manhã, mas todas as refeições continham comidas diferentes, muita gente deixava de comer algo só por olhar a comida. Eu provava todas e só não gostei de algumas.

  Após comer, partimos para Gelnhausen às 10h. O Aquecimento vocal estava marcado para 12h35min no Grimmelshausen Schule. Eu realmente não sei porque a organização marcava horários tão ruins, detesto coisas no final da manhã até o início da tarde. Preferia que tudo fosse no período da tarde, já teríamos almoçado e descansado.

  Eu estava bem confiante para a apresentação do Folclore, nossa segunda categoria inscrita. As músicas eram bem fortes, harmonias bonitas e letras muito legais. Nós tínhamos fortes concorrentes nesta categoria : Taipei Century Choir (Taipei), Female Choir of Tallinn University (Estônia) e Coro Universitario Sant Yago de Valencia (Espanha). 

  Depois do aquecimento vocal, fomos andando do Grimmelshausen Schule até o Stadhalle, não era distante. Mais uma vez, pelas portas do fundo entramos. As roupas já preparadas para entrar no palco, os homens tinham uma faixa na cintura que podia ser virada ao contrário para mudar a estampa, as mulheres tinham as saias dessa maneira também.

  O apresentador nos chamou para o palco, eu lembro bem de quando nós nos instalamos atrás da cortina fazendo sons da floresta para a música Cunhataiporã. Eu fazia o som de pássaro filhote com a boca. Primeiro entraram os baixos e as contraltos, depois tenores e sopranos. O nosso de natureza foi muito bom, eu estava me sentindo muito bem, havia uma luz nas apresentações que ficava em cima da Fátima, segundo a posição que eu ficava no palco. Eu via aquela luz em todas as apresentações no Stadhalle e lembrava que eu devia ser como ela por dentro. A música foi fantástica. Cantamos Banzo Maracatu também, uma música com forte influência africana. Estava tudo dando muito certo. Adeus de Caboclinho foi ótima e Taieiras foi muito bela. Quando terminamos, o público alemão delirou, todo mundo aplaudiu e apitou muito, saímos logo do palco e até sair do Stadhalle, eu ainda ouvia os aplausos de longe. 

  Nós amamos aquela apresentação, que como a de Música Secular, foi tudo bem melhor que qualquer ensaio nosso no Brasil. Sem saber, nós ganhamos um fã especial, que logo falarei a respeito. Fomos ao Obermarkt almoçar, meus almoços na Alemanha eram apenas pães com salsichas. Não gosto de lentilha e comer sopa do que não se gosta, não é muito bom. Só tínhamos essas duas opções no Obermarkt.

  Algum tempo depois, Carola Obernitz nos chamou pra dizer que fomos selecionados para o Grand Prix do Festival, onde os 8 melhores coros do festival inteiro cantariam. Foi uma festa nesse anúncio, só poderiam participar do Grand Prix  os 2 melhores de cada categoria, o que significava que estávamos em 1º ou 2º lugar em uma das Categorias. Carola nos disse que não sabia em que posição estávamos, mas falou que fomos classificados pela categoria Folclore que acabamos de cantar. Isso foi maravilhoso para nós.

  Ficamos sabendo que o coro da Espanha não tinha se classificado entre os 8 melhores do Grand Prix. Eles cantaram antes da gente no Folclore. Eu não os tinha escutado ainda, não tinha ideia de como cantavam, mas eu sabia que eles eram bons, talvez pelo ar que todo músico sente mesmo. O Grand Prix começaria às 15h, estávamos tentando relaxar bem para cantar as músicas do Folclore com todo o gás  novamente.

  Quando chegou a hora do Grand Prix, cantamos de novo maravilhosamente e no final terminamos com a música Banzo Maracatu, a platéia novamente enlouqueceu. Quando ela estava acabando começamos a fazer a velha tradição do Coretfal que é cantar pelo meio do público. Descemos do palco ao som dos tambores que os nossos músicos tocavam e das batidas de palmas da platéia acompanhando o ritmo e dançamos até subir de novo no palco e desaparecer do Stadhalle através das cortinas. Foi tudo de bom, a sensação era de dever cumprido.

  Como eu falava, sem saber, ganhamos um fã especial. Era um rapaz do coro Spektrum da República Checa, que curiosamente tinha cantado na categoria Folclore também. O cara tinha os cabelos escuros, eram grandes e ele fazia um rabo de cavalo no cabelo. Possuía uma barba cheia e era muito doidão, parecia a imagem que fazem de Jesus. Aquele homem estava nos esperando na parte dos fundos do Stadhalle, quando saímos, ele apareceu e tirou muitas fotos da gente, de todos os ângulos e nos acompanhou até quando podia, só tirando foto. Era muito engraçado, porque eu me sentia um pop star, eu andando e o cara atrás de mim tirando foto como um louco, se ele só tirasse foto era uma coisa, mas além de tirar centenas de fotos, ele ainda gritava : "WOW !!!",  "Brazil UHUUU !!!". A nossa fama era tão grande no festival que eu lembro de andar na rua e as pessoas ficavam acenando para mim. Lá eu era famosíssimo.

  Às 18h houve a Cerimônia de Premiação no Obermarkt, nós estávamos um pouco tensos, porque sabíamos que estávamos em 1º ou 2º lugar na categoria Folclore, mas no fundo queríamos ouvir que estávamos em 1º lugar. Depois de muito falatório em Alemão e em Inglês, a Fátima subiu no palco e pegou o nosso prêmio de 2º lugar. Eu fiquei um pouco desapontado naturalmente, mas um 2º lugar foi tudo para a gente. Eu escutei o coro de Taipei, o som era fantástico e eles ficaram em 3º lugar, então para mim aquilo anunciava que tínhamos chegado ao topo realmente.

  Quando o Obermarkt esvaziou um pouco, os coros se confraternizaram dançando juntos com a banda Baselmann Band. Algumas pessoas do Coretfal se juntaram com as inglesas e dançaram samba com elas. Era muito engraçado vê-las dançando. Aquele dia foi perfeito, mas ainda não estava acabado com o nosso retorno ao Wegscheide.

  Agora sem compromissos a cumprir, celebramos bastante. Compraram cerveja e fumaram bastante, agora sim era a hora de fazer isso. Nós colocamos as grades de cerveja fora da casa, lá fora estava frio, então o clima era ideal para as cervejas : geladinhas sem gastar energia elétrica. Os espanhóis nos chamaram para a casa deles, lá eles fizeram algumas brincadeiras bem constrangedoras para quem não é a favor da safadeza com estranhos. Eu preferi ficar de fora da primeira rodada de cada brincadeira, para poder ver como seria. Nós adotamos um cântico deles que era assim : "Alcohol, alcohol, alcohol, alcohol, alcohol, hemos venido emborracharnos, el resultado nos da igual." ♪♫.

  Houve um momento que eles se reuniram e os homens se vestiram de mulheres e as mulheres de homens e cantaram uma música chamada Con el vito. Foi ai que eu vi como eles cantavam, era muito bom, o som era ótimo, foi ai que eu lembrei que eles não foram pro Grand Prix dos 8 melhores coros e nós fomos. Deu um arrepio.

  Lá pras tantas da noite, voltamos para casa, no caminho encontrei algumas pessoas que eu vi voltando da floresta, como quem não quer nada. Como sempre, não podia faltar alguma polêmica não é ? Fomos dormir felizes da vida !

sábado, 13 de agosto de 2011

13 de Agosto de 2010 (5º dia)



  Após tanta confusão, aquela manhã tinha outro sabor; não que aquele sabor fosse bom, mas era melhor que o de antes. Nossa primeira apresentação oficial estava marcada para 11h50min. Era a categoria Música Secular, que eu nunca concordei com a escolha do repertório, porque as músicas eram ótimas, mas não entravam no contexto de Música Secular ao meu ver, talvez de Música Contemporânea cairia bem. 

  Os ensaios em Maceió para Música Secular foram bons, mas ainda deixava a desejar por algumas dificuldades técnicas nas músicas, certos erros que parecem passar de geração a geração dentro do Coretfal. Nossa regente, Fátima Menezes, realmente fez o que pode para melhorar em certas partes de algumas músicas problemáticas, então levamos as músicas desta categoria do melhor jeito que a gente poderia ter levado naquele momento do grupo.

  Às 10h o ônibus já estava nos esperando para partir para Gelnhausen. Eu lembro bem que estava chovendo naquela manhã, o frio de dentro do ônibus e o meu cantinho no fundo do automóvel pareciam estar em perfeita sintonia, eu estava me concentrando para dar o meu melhor, pensando naquilo tudo que eu tinha escrito aqui no blog sobre a luz de dentro na hora do palco.

 Quando chegamos a Gelnhausen, fomos levados até uma escola, era a escola que o "Carlinhos" estudava, ali perto dela havia um carro horrível que todo mundo teve que parar um pouco e olhar de perto. A escola era um edifício azul claro de 2 andares, era chamada - Grimmelshausen Schule - que como em todas as outras casas perto dela, não tinha muro e quando tinha, era um pequeno que qualquer um poderia pular, nada de cercas elétricas, grades, vidros ou arame farpado em cima do muro. 

  Entramos em uma pequena sala à esquerda do hall de entrada, a sala 1. Ali ficamos das 11h10min até a hora da apresentação. Colocamos as nossas bolsas e roupas sobre as cadeiras que estavam dispostas lado a lado no canto da parede. Fizemos Aquecimento Vocal com a Claudiana e quando faltava pouco para subir no palco, eu troquei de roupa e quando eu voltei, as pessoas estavam se reunindo e segurando as mãos umas das outras. O Marcos pediu desculpas pelas coisas que tinha feito até aquele momento e parecia que só porque eu estava com a mente fora daqueles pensamentos das pessoas estarem quase "contra o Coretfal" naquela hora, foram ditas muitas palavras não só dele, mas uma ou outra pessoa se pronunciava, mas como eu não sou de ferro, com aquilo tudo de volta na minha cabeça, eu não aguentei e deixei rolar mais outras lágrimas.

  O Rodrigo veio falar comigo e disse algo como : "Não chore, eu também estou com vontade de chorar, mas agora temos que segurar a vontade, senão isso vai prejudicar a nossa apresentação.". Aquilo foi magnífico, eu tomei minha água e fui confiante. Eu lembrei que os alemães estavam muito excitados para nos ver cantando, eu soube disso ao conversar com uma mulher dentro de uma biblioteca. Ela disse que tinha ouvido falar de um coro do Brasil que era "cheio de rítmo e energia" e que iria nos ver se tivesse como ir no dia. 

  Fomos ao Stadhalle, entramos pelos fundos, onde havia uma escadaria que nos levava até os bastidores do palco, mas ficamos um tempo ainda em uma sala esperando uma apresentação acabar, nos abraçamos e fomos até o palco. Algum momento antes, quando eu estava andando na cidade com o Victor Moura, fomos a Aguardamos o apresentador falar da gente e entramos no palco. Estava lotado.

  Eu olhava atento para a Fátima, foi quando começou "1,2,3... (aquela inspiração bem sonora dela)" : - "Ê... HOJE TEM ARRASTÃO....".  Agora não tinha como escapar, cantamos Arrastão com todo mundo da platéia prestando atenção em cada detalhe e quando chegou uma parte que eu ficava de frente para o público encenando que estava puxando uma rede, eu via como eles olhavam interessados. Foi muito boa experiência.  Depois de Arrastão, cantamos Te Quiero, a já famosa Lata d'água e Os Quindins de Yayá (meu par era a Gal Monteiro). No final as pessoas aparentemente gostaram muito, mas eu sei que para nós mesmos ainda havia algo engasgado.

  Depois disso, fomos liberados para dar umas voltas, eu não lembro se foi nesse dia, mas eu me reuni com algumas pessoas para ir ao Mediamarket, um supermercado em Gründau-Lieblos a 13 min de Gelnhausen. Havia uma garota do evento que sempre que a gente estava perdido, ela aparecia. Como esperado, ela apareceu novamente e nos ajudou a encontrar o ponto ideal para pegarmos o ônibus. Nós a apelidamos de "Mestre dos Magos". Quando o ônibus chegou, demoramos muito para entrar nele, pois o motorista não falava inglês. Uma senhora foi conversar com a Ludmila e algumas pessoas que já estavam com um pé dentro do ônibus para dizer como funcionava o sistema do nosso transporte.

  Na volta perdemos um ônibus, mas conseguimos depois retornar a Gelnhausen, que estava em festa com as bandas Tuxxedo e Headphone. Logo mais voltamos para a nossa casa no Wegscheide em Bad Orb. Teríamos que descansar, afinal no outro dia ainda teríamos que nos apresentar na categoria Folclore, que era a categoria que eu estava mais confiante no nosso sucesso. A essas alturas o Coretfal já era bem famoso na cidade, já tínhamos ganhado essa recompensa, mas no fundo eu não acreditava que o Coretfal ia sair em branco no festival. Mais emoções nos esperavam. 
  

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

12 de Agosto de 2010 (4º dia)



  A minha expectativa para a quinta-feira era muito boa, porque pela nossa agenda, nós faríamos muita coisa. Sairíamos às 10h para Gelnhausen e só voltaríamos às 22h com coisas marcadas para o dia todo. Eu lembro bem daquela rotina das nossas manhãs, quando eu era acordado pelo barulho de dentro do quarto, se não fosse por isso, eu não teria acordado cedo nenhum dia.

  Eram 4 beliches no quarto dos Tenores, na de frente para a porta dormiam Rodrigo (parte debaixo), Wagner (parte de cima), no outro beliche dormiam Bruno (parte de baixo) e Deto (parte de cima). Do lado esquerdo do quarto, eu dividia um beliche com o Leo, que dormia na parte de baixo e eu na parte de cima, do nosso lado o Valdo dormia em outro beliche com o Márcio - que dormia na parte de cima. A nossa janela era grande e dava vista a uma casa grande com campo de vólei de areia. Como o nosso quarto era vizinho ao dos Baixos, a visão não podia ser muito diferente para eles, inclusive eles apelidaram o Victor de "Ursinho", porque ele pediu para que a janela deles fosse fechada "para não entrar um urso".

  Enfim, saímos do Wegscheide às 10h para Gelnhausen. Quando chegamos a cidade estava cheia de gente, haviam mais coros de mulheres do que coros masculinos ou mistos. Haviam muitos lugares no Obermarket para comer, mas para beber só lembro de um lugar que tinha mesas. Houve um atraso na nossa programação, então nosso turismo por Gelnhausen foi prejudicado, não aconteceu às 12h como programado, mas ainda assim havia uma mulher que nos guiava e mostrava um pouco do lado histórico da cidade, inclusive como ela surgiu, ficou famosa e permaneceu firme com o passar dos anos, conhecemos também um pouco da história da Marienkirche - a maior igreja da cidade.

  Nos reunimos com os outros coros às 13h30min no Obermarket. Era a cerimônia de abertura do Festival. Houve muita conversa por parte dos organizadores, mas foi ai que provavelmente nós conhecemos melhor o pessoal dos outros coros. Eu lembro de andar pela cidade e ver o Bruno conversando com as belgas, quando eu vou chegando perto para observar, ele estava falando em inglês com elas e rindo, ao mesmo tempo que falava frases eróticas para elas em Português: "Vou comer tudinho ai" e elas rindo junto sem entender o que ele dizia.

  Mais tarde, às 15h, houve um concerto de paralela por ali. Acredito que foi nessa hora que vimos as nossas concorrentes da categoria Folclore - as estonianas. Lembro que o som delas era bom, elas cantaram uma música que me chamou muita atenção. Elas faziam pequenos grupos separados e neles formavam círculos com todas as meninas com os braços cruzados de frente pro público e cabeças abaixadas, logo mais no decorrer da música, elas começavam a girar cada grupo (círculo) do coro, fazendo movimentos sinistros com os pés e a harmonia era bem macabra e forte - EU AMEI. o Márcio ficou com medo. 

  Fomos fazer outra passagem de palco no Stadhalle às 16h. Nós pedimos para que a organização do evento tirasse os degraus do palco para coros que cantavam parados, precisávamos de bastante espaço para nossas coreografias. Eu vi como era impressionante nós trabalharmos tudo junto, voz, corpo e coreografia para nos apresentarmos. A maiorira dos coros não faz isso, investem muito mais na voz. No entanto, naquele dia algumas pessoas do Coretfal beberam cerveja e fumaram, era o que a Fátima, nossa regente, tinha proibido para cuidarmos das nossas vozes. Ainda bem que eu não estava nesse meio.

  No final isso gerou confusão, pois a maioria dos nossos coralistas, após chegarem a Alemanha, não estavam mais ligando para a voz, andavam falando bem alto pelas ruas no frio e tomavam cerveja e fumavam, tudo o que a Fátima tinha proibido. Então após o nosso reencontro para o retorno ao Wegscheide, houveram discussões por motivos fúteis que teriam sido evitados, tal como quando o Marcos chegou para um grupo de pessoas que estavam por ali falando alto no frio : "Este é o mesmo coral que vai cantar amanhã ?". Isso gerou uma briga entre ele e esse grupo de pessoas. O mal-estar tomou conta do ambiente, de repente e foi muito difícil para todos aquela situação. Eu fiquei muito triste com o que estavam fazendo com o nosso coro, era como se o que eu tivesse sonhado estivesse sendo desmanchado por atitudes fúteis em relação à grandeza do que estávamos passando.

  Quando chegamos na nossa querida "Maximilian-Kolbe-Haus", a Fátima queria nos reunir para conversar e a conversa foi muito dura para repreender estes atos que estavam acontecendo dentro do nosso coro. Nossa preparadora vocal, Claudiana, também falou bastante conosco, ela chorou ao falar da situação e disse que nós tínhamos ali uma família e uma mãe a ser respeitada. Era muito triste a situação, quando terminou a conversa, eu fui dormir e no meio do caminho encontrei meu amigo, Victor Moura, com quem me abracei para que as energias fossem revitalizadas para o dia seguinte e uma lágrima escorreu pelos meus olhos, era a primeira, mas não a última daquela viagem.